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Entrevista de JOSÉ HENRIQUE RODRIGUES TORRES (ZéH)



ENTREVISTA

João Paulo Orsini Martinelli entrevista JOSÉ HENRIQUE TORRES


José Henrique Rodrigues Torres
Juiz de Direito, Professor de Direito Penal da PUC-CAMPINAS. E Membro do IBCCRIM e da Associação Juízes para a Democracia.

1) Como em todas as entrevistas, gostaríamos de saber um pouco de sua origem e, principalmente, o que o levou a estudar Direito.
JHRT. Eu nasci em Botucatu, “onde a lua faz clarão”, terra de Angelino de Oliveira, que compôs a música “A tristeza do Jeca”[1] , um dos maiores clássicos sertanejos de todos os tempos. Por mais non sense que isso possa parecer, talvez a letra dessa música explique porque eu resolvi estudar direito. Neto de um advogado carioca que migrou para o interior paulista e dedicou toda a sua vida à defesa de excluídos, que vivem padecendo de tristeza e “cantando pra se aliviar”... e filho de um advogado apaixonado pelo direito, que dedicou todos os seus dias, intensamente, à defesa daqueles que vivem cantando “o seu sofrer e a sua dor”, que vivem em “ranchinhos à beira chão” e que “já não podem mais cantar”, eu passei a minha infância e a minha adolescência ouvindo emocionantes histórias de injustiças e sofrimentos, mas também de batalhas incansáveis, em audiências nos fóruns, nos julgamentos, nos tribunais, onde heróicos advogados lutavam contra essas injustiças, contra tanto sofrimento. Talvez eu tenha sido submetido a um processo histórico-familiar de sensibilização... Foram muitas madrugadas escondido atrás da porta e ouvindo advogados, reunidos na sala da minha casa, declamando poesias e contando suas aventuras forenses... Verdadeiros “Domquixotes” lutando contra os moinhos e os dragões da injustiça... Acho que acabei acreditando que era preciso engajar-me nessa luta e transformar o mundo. Recentemente, eu participei de um delicioso encontro com colegas do ginásio e do colegial, que, depois de mais de trinta e cinco anos, lembraram-se de um dia em que eu, indignado, assumi a defesa de uma aluna acusada de um ato de indisciplina e desrespeito, algo banal, mas que, em tempos de ditadura, tomou a dimensão de um perigoso ato de subversão à ordem e à autoridade. É isso. Eu já estava inoculado pelo vírus do direito. E meus professores já me chamavam de “causídico”. Acho que não tive outra alternativa. Ingressei na Faculdade de Direito de Bauru, da Instituição Toledo de Ensino, em pleno estertor da ditadura civil e militar que infelicitava o Brasil naquela época. Participei intensamente da política acadêmica, formei-me em 1980, especializei-me em “Direito das Relações Sociais”, dediquei-me ao magistério, advoguei, também intensamente, por quase sete anos e, de repente, decidi ingressar na Magistratura.

2) Por que essa decisão de abandonar a advocacia e ingressar na Magistratura e, especificamente, dedicar-se à justiça criminal? Conte-nos um pouco de sua carreira na Magistratura.
JHRT. Eu ainda tenho muita saudade dos meus tempos de advocacia. São inúmeras as batalhas judiciais inesquecíveis. Aliás, lembro-me, perfeitamente, de minha primeira defesa no Tribunal do Júri. O réu, de alcunha “Perna Torta”, era mais um entre milhares desses cidadãos estigmatizados pela injustiça social e econômica, que enfrentara o preconceito e a violência e que reagira com o que lhe restara de dignidade. Ele foi absolvido e a sua dignidade foi restaurada. Eu advogava no escritório de meu pai e, sob sua dedicada supervisão e paciente aconselhamento, fazia “clínica geral”, como era comum, naquela época, nas bancas de advocacia do interior. Mas, com maior regularidade, eu trabalhava em causas criminais, o que me colocava, diariamente, em um constante confronto com um sistema repressivo, seletivo, excludente, irracional e injusto. Todos os dias eu era obrigado a enfrentar situações inusitadas e constrangedoras em Delegacias de Polícia, em Cadeias e até mesmos nas audiências criminais, enquanto vivenciava a experiência do diálogo frequente com aqueles que eram atingidos pela injustiça social e eram agarrados implacavelmente pelos tentáculos desse sistema de “justiça” criminal. Eu, então, comecei a perceber que, como naquela passagem de “O processo”, de Kafka, muita gente ficava inerme diante da porta da lei e da justiça, pois sempre havia um porteiro para impedir o acesso, especialmente dos mais fragilizados. Foi então que eu acreditei que era possível ser o porteiro, tomar a chave em minhas mãos e tentar abrir a porta. Nós vivíamos, em 1987, a experiência histórica do fim de uma ditadura e da luta pela reconstrução da democracia. Estávamos elaborando uma nova constituição. Eu acreditava que era preciso participar efetivamente desse processo político de transformação. Mas eu não conseguia ver-me como um político, participando de disputas eleitorais, engajado em disputas partidárias por cargos no legislativo ou no executivo. Foi então que eu resolvi ingressar na magistratura para ser um agente político. Foi, certamente, uma decisão política. E eu consegui ingressar na magistratura, depois de duas frustradas tentativas. Em uma delas, aliás, quando eu saia do Tribunal de Justiça de São Paulo, depois do anúncio dos aprovados, entre os quais não constava o meu nome, o meu querido sobrinho Fillipe, ao ver os pingos d’água que caiam dos aparelhos de ar condicionado, disse, com a sensibilidade e a sabedoria das crianças, que o prédio estava chorando pela minha exclusão! Isso foi, para mim, mais um incentivo. Persisti. Eu estava convencido de que, como juiz, eu poderia ter uma atuação social com dimensão política no exercício de um poder democrático. Persisti. Fui aprovado no ano seguinte. E aqui estou. Iniciei a minha carreira como juiz substituto em Campinas. Dois anos depois, fui promovido para o Foro Distrital de Serrana, da Comarca de Ribeirão Preto, onde vivi uma experiência muito significativa: eu, que era o único cidadão daquela pequena comunidade a usar paletó e gravata, estava atravessando uma praça, quando um senhor, com as mãos calejadas e o rosto frisado pelas marcas do sol na lavoura, levantou-se e tirou o chapéu à minha passagem; eu o cumprimentei solenemente e continuei caminhando; foram os cinqüenta metros mais longos da minha vida... E acho que ainda não terminei aquela travessia. Em 1989, fui para Tatuí, onde, aliás, por uma incrível e feliz coincidência, meu bisavô, o Desembargador Antonino do Amaral Vieira, havia atuado como juiz, no início do século XX. E, finalmente, em 1992, voltei para Campinas, onde permaneço até hoje como titular da 1ª Vara do Júri. Naquele tempo, eu também respondia pelas execuções criminais e pela corregedoria da polícia judiciária. E, assim, por vários e intensos anos, eu vivi profundas experiências nas visitas às penitenciárias e às delegacias de polícia, vivenciando diálogos marcantes com presidiários, agentes penitenciários e policiais, seres humanos que me fizeram compreender com maior nitidez a irracionalidade desse sistema penal. Assim, desde 1992, eu estou dedicando a minha atividade jurisdicional exatamente no âmbito da justiça criminal, exatamente na área judicial que me motivou a enfrentar os concursos para ingressar na magistratura, empolgado pelo ousado sonho de “transformar o mundo”.

3) E o senhor ainda acredita nesse sonho? Qual a importância do Magistrado na transformação e no desenvolvimento da sociedade?
JHRT. Depois de mais de quase vinte e quatro anos de magistratura, hoje eu percebo que nós, os juízes, temos um poder paradoxal: imenso e insignificante. Esse poder é imenso, por exemplo, quando o juiz toma o filho dos braços de uma mãe, ou quando arranca a liberdade daquele que é jogado ao cárcere, ou quando afasta uma pessoa de seu lar, ou quando desaloja alguém da terra que ocupa. E esse poder é imenso, nesses momentos, porque interfere na individualidade da vida concreta de pessoas reais, que têm a sua própria e única história de vida. Mas esse poder é, ao mesmo tempo, absolutamente insignificante, porque não transforma a realidade política, econômica e social que gesta os abissais problemas que o sistema de justiça fragmenta e individualiza. Hoje, eu acredito que nós juízes atuamos aprisionados nos autos dos processos, enfrentando, com o nosso “imenso poder”, apenas situações individualizadas e fragmentadas de uma imensa realidade, que oculta o perfil do humano e o caráter de instrumento de dominação de um complexo sistema político, cultural e econômico, que atua sob a égide da globalização e privilegia os mais fortes em detrimento dos mais débeis, impulsionado por interesses de conglomerados transnacionais, subjugando os Estados-nações, fruto de um capitalismo do lucro imediato, da grande concentração de capital, da mobilidade e da volatilidade, que ampliam o caráter repressivo do Estado. E essa imensa e complexa realidade, que gesta tanto sofrimento, tanta desigualdade e tanta injustiça, fica, especialmente nos processos criminais, absolutamente distante das páginas dos autos, das audiências e das sessões de julgamento. É por isso que eu acredito que é imprescindível que nós juízes assumamos o nosso papel de garantidores de direitos e da convivência democrática. É isso. Hoje, depois de tantos anos de magistratura, eu acredito que esse é o nosso papel como agentes políticos. Esse é o nosso papel, que pode ser transformador: o papel de intransigentes garantidores dos direitos fundamentais da pessoa humana. O marinheiro, ao conduzir o barco, não pode limitar-se a observar as ondas que se encapelam nas cercanias da embarcação, mas, tem, sim, o dever de observar o horizonte, as profundezas do mar, as procelas que se avizinham, as nuvens e as estrelas, para garantir o seguro navegar. Quando estamos diante de relações humanas fragmentadas e individualizadas pelos lindes processuais, nós não podemos deixar de observar a imensa realidade que nos cerca. E a nossa bússola há de ser, sempre e sempre, a garantia dos direitos fundamentais. Esse é o sonho que ainda alimenta e legitima a minha atividade jurisdicional. É simples assim.

4) O senhor, antes mesmo da vigência da atual legislação penal e processual, entre outras decisões inusitadas, já garantia o contraditório nos interrogatórios, não permitia que os réus ficassem algemados durante os julgamentos no Tribunal do Júri, permitia que os réus conversassem com seus defensores antes de serem interrogados, não recorria de ofício de suas decisões de absolvição sumária, concedia progressão de regime nos casos de crimes hediondos, não julgava desertos os recursos quando os réus fugiam depois da interposição da apelação e não condicionava o recurso do réu à sua prisão. O que o motivava a tomar essas decisões inusitadas?
JHRT. Sinceramente, eu nunca achei que essas decisões eram inusitadas, extravagantes ou excepcionais. Eu apenas acreditava que estava cumprindo o meu papel de garantidor dos direitos fundamentais. Eu sempre acreditei, e isso eu aprendi com a sabedoria e a sensibilidade de Alberto Silva Franco, que a lei, para o juiz, é apenas um ponto de partida, pois o que realmente importa é a garantia da constitucionalidade e da convencionalidade, ou seja, a prevalência das normas e princípios consagrados pela Constituição e pelos Tratados e Convenções de Direitos Humanos. E, por acreditar que a dignidade humana é o princípio fundamental e essencial a ser sempre observado e garantido, procuro pautar minha atividade jurisdicional pelo respeito à dignidade e à humanidade das pessoas, indistintamente, o que me faz lutar todos os dias contra os meus próprios preconceitos e idiossincrasias. A coragem de Antígona precisa ser sempre uma referência. E o ensinamento de Camões não pode ser jamais olvidado: “cessa tudo o que a antiga musa canta, quando outro valor mais alto se alevanta”. E esse valor, na atividade jurisdicional, é exatamente a dignidade humana. Não há nenhuma novidade nisso. Aliás, todas as decisões que você mencionou em sua pergunta encontraram respaldo em dispositivos expressos de tratados e convenções internacionais de direitos humanos, ratificados pelo Brasil e incorporados ao nosso sistema jurídico positivo com natureza constitucional. Portanto, não há nada de inédito nem de inusitado nessas decisões.

5) Uma importante decisão sua ficou conhecida, por meio da imprensa, quando convocado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, na qual o senhor absolveu um acusado de porte de drogas para uso próprio, alegando a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas. Explique essa decisão.
JHRT. Em março de 2008, quando eu estava atuando em uma das Câmaras Criminais Extraordinárias do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferi um voto afirmando a inconstitucionalidade da criminalização primária do porte de drogas para uso próprio. Inicialmente, foi necessário desclassificar a conduta do réu para porte de drogas para uso pessoal, pois ele havia sido condenado por tráfico. Em seguida, tipificada a conduta do recorrente no artigo 28 da Lei n. 11.343/2006, eu julguei que esse dispositivo era inconstitucional. É que esse tipo penal não traz previsão de nenhuma conduta hábil para produzir lesão que invada os limites da alteridade. Além disso, eu acredito que esse tipo penal viola frontalmente os princípios da igualdade e da inviolabilidade da intimidade e da vida privada, albergados pelo artigo 5º da Constituição Federal como dogmas de garantia individual. Aliás, é oportuno lembrar que a atual política de drogas no Brasil é mantida por uma lógica bélica sanitarista, que acarreta uma opção por modelos punitivos moralizadores e que sobrepõem a razão de Estado à razão de direito, o que, diante de nossa principiologia constitucional, é injustificável. O argumento de que o artigo 28 da Lei de Drogas é de perigo abstrato, bem como a alegação de que a saúde pública é o bem tutelado, não é sustentável juridicamente, pois contraria inclusive a expressão típica desse dispositivo criminalizador, lavrado pela própria ideologia proibicionista, o qual estabelece os limites de sua incidência pelas elementares elegidas, que determinam, expressamente, o âmbito individualista da lesividade e proíbem o expansionismo desejado. Basta ler o tipo penal em menção, que descreve, exclusivamente, a conduta de quem adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou porta, “para consumo pessoal”, drogas proibidas. O elemento subjetivo do tipo, evidenciado pela expressão “para consumo próprio”, delimita com exatidão o âmbito da lesividade e impede qualquer interpretação expansionista que extrapasse os lindes da autolesão. Assim, transformar aquele que tem a droga apenas e tão-somente para uso próprio em agente causador de perigo à incolumidade pública, como se fosse um potencial traficante, implica frontal violação do princípio da ofensividade, dogma garantista previsto no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal. Além disso, a criminalização do porte para uso próprio também viola o princípio constitucional da igualdade, pois há flagrante distinção de tratamento penal com relação aos usuários de drogas ilícitas e lícitas, embora ambas tenham potencialidade de determinar dependência física e psíquica. Mas não é só. Não se olvide a violação ao princípio constitucional garantidor da intimidade e da vida privada, que estabelece intransponível separação entre o direito e a moral. Com efeito, não se pode admitir qualquer intervenção estatal, principalmente de índole repressiva e de caráter penal, no âmbito das opções pessoais, máxime quando se pretende impor pauta de comportamento na esfera da moralidade. Induvidosamente, nenhuma norma penal criminalizadora será legítima se intervier nas opções pessoais ou se impuser aos sujeitos determinados padrões de comportamento que reforçam concepções morais. Como ensina Saulo de Carvalho, a secularização do direito e do processo penal, fruto da recepção constitucional dos valores do pluralismo e da tolerância à diversidade, blinda o indivíduo de intervenções indevidas na esfera da interioridade. É por isso que somente é admissível a criminalização das condutas individuais que causem dano ou perigo concreto a bens jurídicos de terceiros, o que não acontece com a conduta descrita no tipo do artigo 28 da Lei n. 11343/2006. E não se olvide, ainda, que a criminalização do porte de drogas para uso pessoal afronta o respeito à diferença, corolário do princípio da dignidade, albergado pela Constituição Federal e por inúmeros tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil. É por tudo isso que eu acredito ser inconstitucional a criminalização primária do porte de entorpecente para uso próprio.

6) Como Juiz-presidente do Tribunal do Júri, qual a sua opinião sobre o aborto?
JHRT. Eu também estou convencido de que a criminalização do abortamento também é inconstitucional. E, como diz Fernando Pessoa, “há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousamos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”. É preciso fazer essa travessia. A criminalização do abortamento é incompatível com o sistema de proteção dos Direitos Humanos das Mulheres, o qual foi incorporado ao sistema constitucional brasileiro. Aliás, os organismos internacionais de Direitos Humanos têm proclamado, reiteradamente, por declarações, tratados, assembleias e convenções, que a criminalização do aborto contraria de modo flagrante os direitos humanos, sexuais e reprodutivos das mulheres. E essa criminalização constitui, não uma forma de proteção para a vida dos fetos, como equivocadamente tem sido proclamado, mas, sim, um instrumento ideológico de controle da sexualidade feminina. Além disso, representa um mero instrumental simbólico da ideologia patriarcal, que não tem sido eficaz nem útil para a proteção da vida intra-uterina. Na realidade, a criminalização do aborto está sendo mantida com um enorme custo social, impede a implantação e efetivação de medidas realmente eficazes para o enfrentamento do problema e acarreta às mulheres terríveis sequelas e morte. Além disso, a criminalização do abortamento contraria princípios jurídicos e democráticos. O princípio da idoneidade, por exemplo, exige que a criminalização de qualquer conduta deve ser um meio útil para controlar um determinado problema social. Contudo, a criminalização do aborto tem sido absolutamente inútil, ineficaz e ineficiente para conter a prática dessa conduta. Basta lembrar que, de acordo com dados oficiais do Ministério da Saúde, são praticados mais de um milhão de abortos no Brasil todos os anos. Mas, a criminalização do aborto também viola o princípio da subsidiariedade, que determina que, no processo democrático de criminalização, devem ser considerados os benefícios e os custos sociais causados pela adoção da medida proibicionista criminalizadora. Lembre-se de que o aborto inseguro, praticado na ilegalidade, é uma das principais causas de morte materna no Brasil, onde centenas de milhares de mulheres estão colocando em risco as suas vidas e a sua saúde para interromper gestações não desejadas. E como observam os médicos Aníbal Fagundes e José Barzelatto, que são dois profissionais respeitados internacionalmente, a segurança do aborto se correlaciona fortemente com a sua legalidade: a maioria dos abortos ilegais é de risco, enquanto a maioria dos abortos legais é realizada sob condições de segurança. Decididamente, milhares de mulheres, vítimas da exclusão e da dominação de uma ideologia patriarcal que não tem fronteiras, pobres em sua grande maioria, estão vivenciando, todos os anos, uma experiência dantesca. Abandonadas no lago de Tântalo, essas mulheres têm enfrentado uma terrível guerra, sem precedentes, contra a omissão da sociedade e, em especial, dos Estados, inclusive daqueles que se dizem sociais e democráticos, e que se proclamam garantidores dos direitos humanos. Portanto, a principal e mais terrível consequência da criminalização do aborto, que acarreta a prática do aborto inseguro, é o enorme índice de mortes de gestantes. Mas, além disso, centenas de milhares de mulheres, todos os anos, estão sofrendo terríveis consequências físicas e psíquicas em razão do abortamento realizado em condições precárias e inseguras. E não se olvidem as não menos terríveis consequências sociais e econômicas geradas pelo abortamento clandestino, que, realizado em condições inseguras e desumanas, deixa muitos filhos na orfandade e desestrutura unidades familiares. Aliás, até mesmo do Consenso de Genval, realizado na Bélgica, em 1994, e da Declaração de Chiang Mai, realizada na Tailândia, em 2004, ficou constando que adescriminalização do aborto é uma resposta mínima a essa realidade. A legislação repressiva-punitiva tem acarretado um significativo impacto negativo para a vida das mulheres, especialmente para aquelas de baixa renda, que, destituídas de outros meios e recursos, ora são obrigadas a prosseguir na gravidez indesejada, ora sujeitam-se à prática de abortos em condições de absoluta insegurança. O drama do aborto ilegal tem gerado um evitável e desnecessário desperdício de vidas de mulheres, acometendo com acentuada gravidade e seletividade as mulheres que integram os grupos sociais mais vulneráveis. Mas não é só. O princípio da racionalidade, embasado na principiologia do Estado-Penal Mínimo e da ultima ratio, proclama que a criminalização somente se justifica quando não houver outros meios ou alternativas para o enfrentamento do problema social a ser arrostado. E é absolutamente inegável que o problema do aborto pode e deve ser enfrentado fora do sistema penal, de modo mais eficaz e não danoso, sem que as mulheres tenham que suportar os riscos do aborto inseguro. É infinitamente mais eficaz adotar políticas públicas de promoção da saúde das mulheres, em especial no âmbito da saúde sexual e reprodutiva, criar e implantar programas eficientes de planejamento familiar, promover a educação formal, bem como a informal, capacitar profissionais para promover o acolhimento das mulheres, manter de estruturas sanitárias preparadas para garantir os direitos à saúde física e psicológica, manter sistemas de acolhimento e orientação, promover a igualdade de gênero e o afastamento da ideologia patriarcal, ampliar o poder das mulheres na tomada de decisões sobre a sua sexualidade e reprodução, apoiar integralmente a maternidade, garantir informações sobre a sexualidade e o uso dos meios de anticoncepção e, ainda, garantir o acesso pleno aos meios anticonceptivos. E não é só. A criminalização do aborto também afronta as exigências jurídico-penais de não se criminalizar uma conduta de modo simbólico ou para impor uma determinada concepção moral, ou para punir condutas freqüentemente aceitas ou praticadas por parcela significativa da população. Portanto, eu não tenho nenhuma dúvida de que é inconstitucional a criminalização do abortamento. Aliás, se vocês me permitem, eu escrevi um artigo sobre esse tema, que foi publicado no livro “Direito Penal e Processo Penal. Estudos em homenagem ao professor Paulo Cláudio Tovo”, pela Editora Sapiens, de Porto Alegre, em 2010. Nesse estudo, eu procurei demonstrar, detalhadamente, todo o meu convencimento a respeito desse assunto. Na realidade, infelizmente, esse tema tem sido tratado de uma forma equivocada. Ser a favor ou contra o aborto é um falso dilema. Ninguém é a favor do aborto. Este é um problema social e de saúde pública que deve realmente ser enfrentado pela sociedade. Contudo, o enfrentamento desse terrível problema pelo viés repressivo, com os instrumentos desse irracional e deletério sistema penal, é totalmente equivocado. Mas eu ainda acredito que a sociedade terá, em breve, lucidez suficiente para despir-se dos preconceitos e acabar com a criminalização do abortamento, encontrando, fora do sistema penal, meios mais eficazes, mais eficientes e menos traumáticos e prejudiciais para o equacionamento e enfrentamento desse gravíssimo problema.

7) O senhor entende que a ortotanásia deve ser compreendida como homicídio?
JHRT. Não. Ortotanásia não é homicídio. Não é crime. É um procedimento médico absolutamente lícito e não tipifica o homicídio. Todo o questionamento sobre esse tema começou com a edição da Resolução n. 1.805, do Conselho Federal de Medicina, que, em 2006, permitiu ao médico suspender ou limitar procedimentos e tratamentos que apenas prolongam artificialmente a vida de pacientes em estado terminal, nos casos de doença grave e incurável. E isso bastou para que o Ministério Público Federal, em 2007, promovesse uma Ação Civil Pública contra o Conselho Federal de Medicina, pedindo à Justiça Federal a revogação da mencionada resolução, alegando, que a ortotanásia, assim como a eutanásia, caracterizaria o crime de homicídio. E a Justiça Federal, acolhendo o pedido de antecipação de tutela, suspendeu liminarmente a vigência da referida resolução. Contudo, depois, ouvido o Conselho Federal de Medicina, o Ministério Público Federal reconheceu o equívoco de seu entendimento inicial e admitiu que a ortotanásia não constitui crime de homicídio. Finalmente, a Justiça Federal julgou improcedente a ação proposta. Assim, hoje, é possível afirmar, inclusive com base em uma decisão judicial definitiva, que a Resolução CFM n. 1.805/2006, que está atualmente em plena vigência, diz respeito à prática da ortotanásia, nada tem a ver com a eutanásia, constitui um alerta contra a distanásia, é constitucional, não acarreta violação a nenhum dispositivo legal, não representa apologia ao homicídio nem incentiva a prática de qualquer conduta criminosa ou ilícita e está absolutamente de acordo com a nossa sistemática jurídico-penal. Além disso, é preciso lembrar que o Conselho Federal de Medicina, em 2009, editou o novo Código de Ética Médica, proibindo a prática da “distanásia” e legitimando, mais uma vez, expressamente, a “ortotanásia”. E o CFM está coberto de razão. É que a ortotanásia realmente não tipifica o homicídio.
8) Mas, se o médico suspender o tratamento, o paciente morre. Isso não é homicídio? Porque, então, essa prática não se enquadra no tipo do homicídio, como o senhor afirma? O que é exatamente a ortotanásia? O senhor poderia também explicar, sob o ponto de vista jurídico-penal, o que se entende por eutanásia e distanásia?
JHRT. Muito bem, o homicídio é um crime comissivo e, assim, em princípio, somente pode ser praticado por ação, em respeito ao princípio da legalidade. Logo, o homicídio somente poderá ser praticado por omissão excepcionalmente, ou seja, quando a omissão for penalmente relevante, quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado, nos termos do parágrafo 2º do artigo 13 do Código Penal. Ora, como a ortotanásia consiste em deixar o paciente terminal morrer, estamos diante de uma omissão. Trata-se de uma conduta omissiva diante de uma morte inevitável, pois o paciente está em estado terminal de uma doença incurável. Nessa situação específica, não há possibilidade nem dever de se evitar a morte. Portanto, não é possível falar em omissão relevante sob o enfoque jurídico-penal. E não se pode confundir ortotanásia com eutanásia ativa nem com eutanásia passiva. Na eutanásia ativa, ocorre uma ação homicida. Nos filmes “Invasões Bárbaras” e “Menina de Ouro” a droga letal é injetada nos pacientes. Houve ação. E a mesma coisa ocorre no final do filme “You Don’t Know Jack”, de Barri Levinson, quando o médico Jack Kevorkian, que ficou conhecido por “Dr. Morte”, injeta em uma paciente uma droga, causando-lhe a morte. Sem dúvida, a eutanásia ativa tipifica o homicídio e, na melhor das hipóteses para o homicida, nesse caso, pode ficar configurado um homicídio privilegiado, nos termos do parágrafo único do artigo 121 do Código Penal. Na Holanda e na Bélgica, a eutanásia, ou seja, o homicídio piedoso, está legalizada e não constitui crime. Todavia, no Brasil, a eutanásia ativa continua sendo criminosa. E a eutanásia passiva também é criminosa. É que, nesse caso, o médico deixa o paciente morrer, por piedade, para evitar seu sofrimento, mas diante de uma morte evitável, o que não é o caso da ortotanásia. Nos casos de eutanásia passiva, há expectativa de transitoriedade e possível reversibilidade. Assim, na eutanásia passiva, a omissão médica pode ser tipificada como homicídio, posto que seja este um crime comissivo, porque há uma omissão relevante, ou seja, porque havia possibilidade e dever de evitar o resultado morte. Trata-se de um homicídio por omissão, possivelmente privilegiado, mas é um homicídio. E também não há confundir ortotanásia com auxilio ao suicídio. Esse delito, tipificado no artigo 122 do Código Penal, acontece quando o médico, por exemplo, dá a droga ao paciente, que a ingere ou injeta no próprio corpo, praticando, assim, o suicídio. Isso acontece, por exemplo, nos primeiros casos do filme “You Don’t Know Jack” e, também, no filme “Mar adentro”, quando os amigos de Ramón, interpretado por Javier Bardem, colocam ao seu alcance um frasco com uma substância letal e ele sorve essa substância, praticando, assim, o suicídio com o auxílio indireto de seus amigos. Mas nada disso pode ser confundido com a ortotanásia, que é totalmente diferente, que é o deixar morrer um paciente terminal de uma doença incurável. Na ortotanásia, não há falar em possibilidade de evitar o resultado morte. Logo, juridicamente, é impossível falar em crime comissivo por omissão. Ora, se não há possível reversibilidade, se não há esperada transitoriedade, é evidente que os aparelhos de suporte são ligados ou mantidos, não para evitar a morte, que é inevitável, irreversível e inexorável, mas, sim, para manter a vida artificialmente. A vida, nessa situação, mantida por aparelhos (ventilação assistida, reanimadores, tratamento em UTI), não é um dado da realidade, mas, sim, um mero artifício. O médico não pode evitar a morte. Os procedimentos e tratamentos não têm nenhum sentido curativo. Isso basta para afastar a incidência do parágrafo 2º do artigo 13 do Código Penal. Mas, além disso, na ortotanásia, também não há falar em dever médico de agir. Na realidade, há o dever de não permitir que o paciente sofra inutilmente em decorrência de uma inaceitável obstinação terapêutica. Aliás, recentemente, o Tribunal Federal Alemão decidiu que, se o paciente pede, expressa ou presumidamente, a suspensão de medidas inúteis de prolongamento da vida, o médico pode e deve satisfazer esse seu pedido, e pode interromper o tratamento, sem que esteja cometendo homicídio. Aliás, segundo essa decisão, se o médico insistir na mantença desses tratamentos fúteis, acarretando ao doente terminal um sofrimento inútil, praticará a “distanásia” e poderá responder pelo crime de “omissão de socorro” ou por “lesões corporais”, em razão da tortura ou do tratamento cruel que impuser ao doente. No Brasil, pode ocorrer, juridicamente, a mesma coisa: o médico que insistir em manter um tratamento ou qualquer procedimento inócuo, artificioso, postiço e gravoso para o doente terminal, acometido de uma doença incurável, expondo-o, assim, à dor e ao sofrimento, contrariando a vontade do paciente ou de seu representante legal, estará praticando a censurável distanásia, e também estará sujeito a responder, no âmbito da responsabilidade civil e criminal, pelas lesões corporais, pelo crime de constrangimento ilegal, pela tortura e pelo tratamento cruel que impuser ao paciente. E não se olvide que, de acordo com inúmeras normas legais, constitucionais e internacionais de proteção dos direitos humanos, os pacientes têm o direito de não serem submetidos a tratamentos desumanos e cruéis e o direito à autonomia e à autodeterminação, além, obviamente, do direito de ter a sua dignidade respeitada. Assim, não há mesmo falar em dever médico de manter os tratamentos ou aparelhos, contra a vontade do paciente terminal de uma doença incurável. Os médicos têm apenas o dever de manter os cuidados paliativos, ou seja, os cuidados necessários para aliviar a dor e o sofrimento, sob pena de caracterização do crime de omissão de socorro. Decididamente, portanto, deixar morrer diante da impossibilidade terapêutica de cura não é crime. Ou seja, ortotanásia não é homicídio.
9) Como professor universitário, o senhor acha que o ensino do direito precisa de ajustes? Deve haver interação do direito com outros ramos do conhecimento?
JHRT. O direito não é uma ilha da fantasia nem uma caixa de Pandora. Não é possível viver em um mundo de fantasias oníricas, regulado por um sistema exclusivamente normativo, asséptico, neutro, apolítico e distante da realidade social. O sistema penal é um instrumento de sustentação da estrutura de poder e de controle social. Aliás, é a parte mais repressiva e violenta desse sistema de controle: criminaliza os marginalizados para mantê-los distantes do centro de poder; e criminaliza as pessoas dos próprios setores hegemônicos para que sejam mantidos e reafirmados no seu rol e não realizem condutas prejudiciais aos seus interesses. O sistema penal, no seu processo seletivo de controle social, atinge, primacialmente, os vulneráveis, integrantes dos setores periféricos, ou seja, aqueles que não têm a proteção do sistema, que praticam crimes grotescos e que, por isso, são visibilizados e vulnerabilizados. Mas, há, também, aqueles que, posto que integrantes dos setores hegemônicos, praticam também crimes grotescos, o que os visibiliza e vulnerabiliza. E, finalmente, há aqueles que, por perderem a proteção do sistema, são atingidos também. Tem razão Camões: “perdigão que perde a pena, não há mal que não lhe venha”. Enfim, o Sistema Penal, que é essencialmente simbólico e irracional, realiza, na sua atuação pragmática seletiva, um violento controle dos setores marginalizados, possibilita o incremento da faculdade sancionatória arbitrária dos agentes policiais, fomenta a imposição de penas e execuções sem processo e alimenta o conteúdo repressivo e punitivo de ações institucionais que se escondem nos oníricos encantamentos de discursos terapêuticos ou assistenciais. Assim, é preciso conhecer a ideologia que constroi os fundamentos do Direito. A ideologia encobre, oculta ou cria a realidade. Sob o arnês de ideologias, vivemos aventuras, sonhos e pesadelos, como se estivéssemos no País das Maravilhas. Toda ciência é ideológica. Todo saber é ideológico. E o poder manipula as idéias de acordo com a sua conveniência, para a sua preservação e para descartar e afastar aquilo que elas têm de perigoso para a sua sobrevivência. A Mafalda, em um dos brilhantes e sarcásticos cartoonsdo Quino, admoestou Felipe, dizendo-lhe que eram ingênuas as suas idéias de prevalência da cultura em relação aos interesses econômicos, mas Manolito, alerta, sentenciou: “não são ingênuas essas idéias; são perigosas”. Como observa Zaffaroni, não é verdade que tem o poder quem detém o saber. Na realidade, o poder é que controla e condiciona o saber. O poder instrumentaliza as ideologias naquilo que lhe convém e descarta o resto. E basta olhar para a história da humanidade, repleta de atrocidades, justificadas por ideologias manipuladas pelo poder, para encontrar o sistema penal, sempre e sempre, sendo utilizado, ideologicamente, como instrumento violento de controle social. É por isso que não se pode estudar o Direito e, especialmente, o Direito Penal, relegando-se ao olvido o estudo da história, da filosofia, da economia, da antropologia, da geografia, da sociologia, da psicologia e de tantas outras disciplinas, que, posto que chamadas, metaforicamente, de “disciplinas não dominantes”, são imprescindíveis para a compreensão do ser humano e do complexo sistema social, político e econômico no qual estamos inseridos. E, em um Estado de Direito Social e Democrático, a universidade, especialmente com relação ao estudo do Direito, tem que assumir o compromisso, que a justifica e legitima, de, de libertar o ensino da ilha positivista em que se encontra.
10) E o estudo dos Direitos Humanos, deve ser obrigatório nas Faculdades de Direito, especialmente no que diz respeito ao Direito Penal?
JHRT. Isso é induvidoso. Recentemente, ao verificar o resultado de uma pesquisa realizada com 1.390 juízas e juízes brasileiros, senti-me como Alice, mergulhando pela toca do coelho, despencando num poço muito fundo. É que 46,8% dos juízes e juízas que participaram dessa pesquisa responderam que não conheciam nenhum tratado ou convenção internacional de Direitos Humanos. E 97,3% afirmaram que nunca leram e que nem sequer conheciam o Pacto de San José da Costa Rica. Todavia, em um Estado Democrático de Direito, como é o nosso, não se pode nem sequer pensar na aplicação de um sistema penal, essencialmente repressivo e limitador de direitos fundamentais, olvidando-se as normas internacionais de proteção dos Direitos Humanos. Aliás, de acordo com a nossa Constituição, esses direitos integram o rol de garantias fundamentais. Portanto, é inadmissível imaginar que um juiz criminal possa aplicar o direito, interpretar o direito, sem conhecer profundamente as normas e princípios do sistema dos Direitos Humanos. Ora, o que é o Direito Penal senão uma intervenção do Estado para suprimir ou limitar direitos fundamentais no âmbito do controle social? Em consequência, é inadmissível pensar no estudo do Direito e, especialmente do Direito Penal, sem considerar a sua função social no contexto do sistema internacional de proteção dos Direitos Humanos. Veja só. Se não é possível viabilizar uma solução utópica e romântica de abolicionismo com relação ao sistema penal, se também não é aceitável uma concepção meramente prevencionista, que propugna a eliminação e a segregação definitiva dos insurretos para a preservação da segurança nacional, e se não se pode admitir, ainda, a idéia do manejo do direito exclusivamente pela via normativa, então só nos resta uma única alternativa possível, que é o imbricamento do sistema penal interno com a principiologia dos Direitos Humanos. É por isso que é imprescindível estudar, interpretar e aplicar o Direito Penal, considerando a sua capacidade para realizar e garantir os Direitos Humanos, como um instrumento de integração e não de marginalização, visando à diminuição dos níveis de injustiça das estruturas de poder. Eu acredito que o Direito Penal somente pode ser efetivamente democrático se estiver comprometido ideologicamente com os Direitos Humanos e com a garantia da ampliação do espaço social de todos os participantes da sociedade. E, assim, é preciso estudar o Direito Penal sob o arnês dos princípios de Direitos Humanos, garantindo-se a aplicação de um Sistema Penal que não imponha regras morais, que garanta a liberdade de escolha, que promova a regulação racional das condutas humanas, que não interfira no livre desenvolvimento dos indivíduos, que adote restrições mínimas à liberdade, que aplique essas restrições como exceções e apenas quando absolutamente necessário e indispensável para garantir a coexistência social e que respeite, sempre, a dignidade humana.

[1] A TRISTEZA DO JECA (Angelino de Oliveira)
Nesses versos tão singelos/Minha bela meu amor/Pra você quero cantar/O meu sofrer a minha dor/Eu sou como o sabiá/que quando canta é só tristeza/Desde o galho onde ele está/Nessa viola eu canto e gemo de verdade/Cada toada representa uma saudade/Eu nasci naquela serra/num ranchinho a beira chão/todo cheio de buracos onde a lua fáz clarão/quando chega a madrugada lá no mato a passarada/principia o barulhão/Lá no mato tudo é triste/Desde o jeito de falar/Pois o jeca quando canta/Da vontade de chorar/Não tem um que cante alegre/Tudo vive padecendo Cantando pra se aliviar/Vou parar com minha viola/Já não posso mais cantar/Pois o jeca quando canta/Da vontade de chorar/E o choro que vai caindo/Devagar vai se sumindo/Como as águas vão pro mar.

- Publicada em REVISTA LIBERDADES - IBCCRIM - http://www.revistaliberdades.org.br/ (Índice da Revista nº 7 - maio/agosto 2011)

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